“Sou eu que começo? Não sei bem o que dizer sobre mim. Não me sinto uma mulher como as outras. Por exemplo, odeio falar sobre crianças, empregadas e liquidações. Tenho vontade de cometer harakiri quando me convidam para um chá de fraldas e me sinto esquisita à beça usando um lencinho amarrado no pescoço. Mas segui todos os mandamentos de uma boa menina: brinquei de boneca, tive medo do escuro e fiquei nervosa com o primeiro beijo. Quem me vê caminhando na rua, de salto alto e delineador, jura que sou tão feminina quanto as outras: ninguém desconfia do meu hermafroditismo cerebral. Adoro massas cinzentas, detesto cor-de-rosa. Penso como um homem, mas sinto como mulher. Não me considero vítima de nada. Sou autoritária, teimosa e um verdadeiro desastre na cozinha. Peça para eu arrumar uma cama e estrague meu dia. Vida doméstica é para os gatos.
Tenho um cérebro masculino, como lhe disse, mas isso não interfere na minha sexualidade, que é bem ortodoxa. Já o coração sempre foi gelatinoso, me deixa com as pernas frouxas diante de qualquer um que me convide para um chope. Faz eu dizer tudo ao contrário do que penso: nessas horas não sei onde vão parar minhas idéias viris. Afino a voz (...)"
Sou tantas que mal consigo me distinguir. Sou estrategista, batalhadora, porém traída pela comoção. Num piscar de olhos fico terna, delicada. Acho que sou promíscua, doutor Lopes. São muitas mulheres numa só, e alguns homens também. Prepare-se para uma terapia de grupo”.
Mas sou bem diferente do que a autora apresenta esse universo feminista! Mas me identifico em muitas fases.
Certamente o livro é apaixonante, fala sobre as dores femininas, quem gosta de psicanálise e estuda o feminino (\o hauahaha) sempre pode ter esse livro como referência! Tantas frases fantásticas...é dificil escolher uma...mas escolhi uma que revela a poesia e o traço de humor sutil e elegante da autora...Adorei!
“Uma dor anula a outra, dizem. De qualquer maneira, não pretendo deixar meu dedo preso numa gaveta para me distrair desta outra dor, a saudade. Fico com a saudade, que pelo menos não deixa marcas visíveis.”
06:15
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